sábado, 25 de abril de 2015

COMO SONEGAVAM IMPOSTOS NO RS

ZERO HORA 05/12/2014 | 16h52

por Eduardo Rosa


Como agia a organização criminosa que sonegava impostos no RS. Grupo voltado à comercialização de carnes movimentou R$ 250 milhões ao longo dos últimos 10 anos



Material apreendido foi levados à sede do Deic, em Porto Alegre Foto: Ronaldo Bernardi / Agencia RBS


A organização criminosa desarticulada em operação da Polícia Civil e da Receita Estadual na manhã desta sexta-feira tinha um propósito simples: driblar a cobrança de tributos no comércio de carnes.

Se o objetivo era simples, o esquema que possibilitou a movimentação de mais de R$ 250 milhões ao longo dos últimos 10 anos, além da sonegação de R$ 60 milhões em impostos, era complexo. Conforme a investigação iniciada há nove meses, foi observado que o crime era comandado por dois mentores e envolvia um frigorífico legalizado, duas ou três empresas de fachada e outros tantos "laranjas".

A quadrilha aproveitava o fato de o recolhimento de ICMS no setor de carnes ser feito no regime de substituição tributária — ou seja, o imposto é todo pago pela indústria, e não em diferentes etapas.

— Essa gangue criou uma indústria que recebia carne de outros Estados mas não a vendia, a repassava a outra empresa. Como, em tese, o imposto já estava pago pela indústria, que é a responsável, a carne ia para o varejo e os consumidores finais sem pagamento — afirma Paulo Amando Cestari, chefe da Divisão de Fiscalização e Cobrança da Receita Estadual.




Cestari detalha como foi arquitetada a fraude:

1. A carne vinha de outros Estados para um frigorífico do Rio Grande do Sul, que teria de pagar o ICMS ao vender o produto, mas não pagava, pois o imposto é cobrado na hora de comercializar a carne.

2. Em vez de a carne ser vendida, ela era repassada ao atacadista (uma empresa de fachada), sem o registro da transação.

3. O atacadista vendia ao varejista (supermercados e açougues, por exemplo) sem pagar o ICMS, já que isso deveria ter sido feito pelo frigorífico.

4. O fato de o frigorifico comprar um produto altamente perecível e não o vender começou a gerar desconfiança. Por outro lado, havia atacadistas fazendo as vendas sem terem realizado as compras.

5. Durante a investigação, também foi descoberto que a emissão de notas do frigorífico e de atacadistas eram feitas com o mesmo IP (número que identifica um ponto de acesso único na internet).

Para acabar com esse esquema, foram cumpridos 55 mandados de busca e apreensão em casas e empresas e 15 mandados de prisão temporária — 13 pessoas foram detidas e duas não haviam sido encontradas até o início da tarde. A Justiça deferiu pedidos da Polícia Civil como quebra de sigilo fiscal dos investigados e bloqueio de bens.

— Os crimes são formação de organização criminosa, falsificação de documentos, falsidade ideológica, sonegação fiscal e lavagem de dinheiro — diz o delegado Joerberth Nunes, titular da Delegacia Fazendária, vinculada ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic).

O lucro obtido com o esquema era usado para adquirir bens, como as dezenas de veículos apreendidos — vários com valores superiores a R$ 100 mil.

— Futuramente, a ideia é que sejam usados para ressarcir os cofres públicos, conforme a nova lei de lavagem de dinheiro e do crime organizado — complementa o delegado Daniel Mendelski.

Receita desconfiou de tentativa de quitar impostos com cheques furtados

A apuração dos fatos teve início quando a Receita Estadual constatou que empresas tentavam pagar impostos utilizando cheques furtados. Para que o pagamento fosse aceito pelo banco, os criminosos adulteravam as guias de arrecadação, colocando o nome do titular do cheque. Alguns varejistas também se beneficiavam do esquema. Além do prejuízo financeiro, grande parte da carne era imprópria para o consumo, por ser transportada e armazenada de forma precária.

A Operação Dariba, que significa "imposto" em árabe, contou com a participação de mais de 400 servidores estaduais — entre delegados, agentes e auditores fiscais — e apoio da Polícia Federal. Um mandado de prisão foi cumprido em Belém do Pará e os demais em 16 cidades gaúchas, incluindo Porto Alegre. Os nomes dos investigados não foram divulgados, e o prazo para que o inquérito policial seja remetido à Justiça é 30 dias.

*Zero Hora

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