ZERO HORA 21/03/2015 | 08h07
31% dos imóveis do Minha Casa Minha Vida estão irregulares em cidade do noroeste gaúcho. Reportagem constatou diversos problemas com o programa durante 40 dias de investigações
por Ânderson Silva e Humberto Trezzi
Secretária Municipal de Habitação de Cruz Alta, Elisabeth Linck, tenta retomar as habitações ocupadas por pessoas não autorizadas Foto: Fernando Gomes / Agencia RBS
Está equivocado quem pensa que irregularidades no programa Minha Casa Minha Vida só ocorrem nas grandes cidades.
A reportagem constatou que em pelo menos oito cidades gaúchas de porte médio proliferam denúncias de comércio ou aluguel irregular de imóveis do programa governamental.
O pior caso encontrado acontece em Cruz Alta, no noroeste gaúcho. De 265 residências do programa construídas no loteamento Vida Nova II, pelo menos 82 não estão mais com os mutuários originais – foram repassadas para outras pessoas, sem autorização. Ou seja, um em cada três imóveis está em situação irregular. Com relação a 52 moradias, já foi formalizada denúncia para investigação por parte do Ministério Público Federal (MPF) e pela Caixa Econômica Federal. A prefeitura tem um dossiê a respeito das outras 30 casas. As denúncias foram feitas em junho de 2013 e maio de 2014.
– Chegamos a receber de 20 a 30 pessoas com reclamações na secretaria. Residências acabaram invadidas, inclusive servindo como abrigo de criminosos – afirma a secretária municipal de Habitação e Interesse Social de Cruz Alta, Elisabeth Linke.
Elizabeth diz que a Caixa ainda não se manifestou sobre o assunto. Ela aguarda avaliação do banco, uma reintegração de posse que viabilize repasse de imóveis invadidos a outras famílias.
– Temos muito interesse que o assunto seja resolvido, já que o município foi o doador da área onde se encontra o loteamento – explica.
Em fevereiro, ZH esteve em Cruz Alta e comprovou a facilidade com que casas são vendidas, alugadas e invadidas. Sem se identificar, os repórteres passearam pela Rua Maria de Lourdes Rousselet, uma das principais do loteamento Vida Nova II, verificando ofertas de residências para comprar. Na casa de número 93 daquela via, o carpinteiro Antônio Carneiro dos Santos admite que vende o imóvel por R$ 2 mil. Questionado por que o preço está baixo e se existem papéis legalizando o negócio, Carneiro é sincero.
– Olha, se tivesse papel eu cobrava R$ 15 mil. Na realidade, a casa não é minha, estou ocupando ela. O antigo morador era um mendigo, que vivia na rua. Entrei aqui com a família e vou ficando. Quero me mudar, em busca de emprego, e por isso vendo tudo por R$ 2 mil, incluindo móveis. Financiamento não tenho – admite.
A prefeitura de Cruz Alta informa que tramita contra Carneiro uma ação judicial de despejo, porque ele invadiu a casa de um mutuário, Jorge da Rosa Santos.
Duas ruas lomba acima, na Rua Victório Della Mea, dona de um pequeno armazém, Jaque admite que o marido, conhecido como Nico, medeia venda de casas no loteamento. Nico é o apelido de Osmar Simões Pires.
– Quando sabe de alguém interessado, ele ajuda a vender. Tem casa por R$ 3 mil, R$ 4 mil, R$ 5 mil. Aí tu faz um contrato de gaveta e fica pagando a prestação, que é baixa, em torno de R$ 40 mensais. Aquela casa ali em frente foi o Nico que vendeu – aponta.
Na mesma rua, em outra parte do loteamento, a reportagem encontra a moradora Dejanira Fátima da Cunha Ferreira entrando na casa 51, que parece abandonada. Ela admite que não é a dona e que ocupou a residência quando a mutuária original se mudou para Vacaria. O imóvel está depredado, repleto de detritos e sem parte do forro, mas Dejanira diz que arruma o local para colocar uma irmã ali.
– Tentei me legalizar na Caixa Federal, mas ninguém me ajudou. Aí vou ficando. Melhor que deixar drogados ocuparem a casa – justifica ela.
A prefeitura informa que Dejanira foi denunciada à Caixa em 2013 por invasão de três residências do Minha Casa Minha Vida, nas quais colocou familiares.
O MPF abriu inquérito para apurar as invasões, aluguéis e vendas em Cruz Alta.
CONTRAPONTOS
O que diz Antônio Carneiro dos Santos:
Não tenho documento do imóvel, entrei aqui porque o antigo morador saiu. Até por isso, cobro apenas R$ 2 mil e quem comprar leva meus móveis também.
O que diz Dejanira Fátima da Cunha Ferreira:
A casa vivia ocupada por drogados. Aí, na saída deles, botei minha irmã para morar e tô consertando. Tentei regularizar a situação na Secretaria de Habitação e na Caixa, mas não consegui.
O que diz Osmar Simões Pires, o Nico:
Não vendo casas, não sei do que tu tá falando. Eu lido com carreira, corrida de cavalo.
31% dos imóveis do Minha Casa Minha Vida estão irregulares em cidade do noroeste gaúcho. Reportagem constatou diversos problemas com o programa durante 40 dias de investigações
por Ânderson Silva e Humberto Trezzi
Secretária Municipal de Habitação de Cruz Alta, Elisabeth Linck, tenta retomar as habitações ocupadas por pessoas não autorizadas Foto: Fernando Gomes / Agencia RBS
Está equivocado quem pensa que irregularidades no programa Minha Casa Minha Vida só ocorrem nas grandes cidades.
A reportagem constatou que em pelo menos oito cidades gaúchas de porte médio proliferam denúncias de comércio ou aluguel irregular de imóveis do programa governamental.
O pior caso encontrado acontece em Cruz Alta, no noroeste gaúcho. De 265 residências do programa construídas no loteamento Vida Nova II, pelo menos 82 não estão mais com os mutuários originais – foram repassadas para outras pessoas, sem autorização. Ou seja, um em cada três imóveis está em situação irregular. Com relação a 52 moradias, já foi formalizada denúncia para investigação por parte do Ministério Público Federal (MPF) e pela Caixa Econômica Federal. A prefeitura tem um dossiê a respeito das outras 30 casas. As denúncias foram feitas em junho de 2013 e maio de 2014.
– Chegamos a receber de 20 a 30 pessoas com reclamações na secretaria. Residências acabaram invadidas, inclusive servindo como abrigo de criminosos – afirma a secretária municipal de Habitação e Interesse Social de Cruz Alta, Elisabeth Linke.
Elizabeth diz que a Caixa ainda não se manifestou sobre o assunto. Ela aguarda avaliação do banco, uma reintegração de posse que viabilize repasse de imóveis invadidos a outras famílias.
– Temos muito interesse que o assunto seja resolvido, já que o município foi o doador da área onde se encontra o loteamento – explica.
Em fevereiro, ZH esteve em Cruz Alta e comprovou a facilidade com que casas são vendidas, alugadas e invadidas. Sem se identificar, os repórteres passearam pela Rua Maria de Lourdes Rousselet, uma das principais do loteamento Vida Nova II, verificando ofertas de residências para comprar. Na casa de número 93 daquela via, o carpinteiro Antônio Carneiro dos Santos admite que vende o imóvel por R$ 2 mil. Questionado por que o preço está baixo e se existem papéis legalizando o negócio, Carneiro é sincero.
– Olha, se tivesse papel eu cobrava R$ 15 mil. Na realidade, a casa não é minha, estou ocupando ela. O antigo morador era um mendigo, que vivia na rua. Entrei aqui com a família e vou ficando. Quero me mudar, em busca de emprego, e por isso vendo tudo por R$ 2 mil, incluindo móveis. Financiamento não tenho – admite.
A prefeitura de Cruz Alta informa que tramita contra Carneiro uma ação judicial de despejo, porque ele invadiu a casa de um mutuário, Jorge da Rosa Santos.
Duas ruas lomba acima, na Rua Victório Della Mea, dona de um pequeno armazém, Jaque admite que o marido, conhecido como Nico, medeia venda de casas no loteamento. Nico é o apelido de Osmar Simões Pires.
– Quando sabe de alguém interessado, ele ajuda a vender. Tem casa por R$ 3 mil, R$ 4 mil, R$ 5 mil. Aí tu faz um contrato de gaveta e fica pagando a prestação, que é baixa, em torno de R$ 40 mensais. Aquela casa ali em frente foi o Nico que vendeu – aponta.
Na mesma rua, em outra parte do loteamento, a reportagem encontra a moradora Dejanira Fátima da Cunha Ferreira entrando na casa 51, que parece abandonada. Ela admite que não é a dona e que ocupou a residência quando a mutuária original se mudou para Vacaria. O imóvel está depredado, repleto de detritos e sem parte do forro, mas Dejanira diz que arruma o local para colocar uma irmã ali.
– Tentei me legalizar na Caixa Federal, mas ninguém me ajudou. Aí vou ficando. Melhor que deixar drogados ocuparem a casa – justifica ela.
A prefeitura informa que Dejanira foi denunciada à Caixa em 2013 por invasão de três residências do Minha Casa Minha Vida, nas quais colocou familiares.
O MPF abriu inquérito para apurar as invasões, aluguéis e vendas em Cruz Alta.
CONTRAPONTOS
O que diz Antônio Carneiro dos Santos:
Não tenho documento do imóvel, entrei aqui porque o antigo morador saiu. Até por isso, cobro apenas R$ 2 mil e quem comprar leva meus móveis também.
O que diz Dejanira Fátima da Cunha Ferreira:
A casa vivia ocupada por drogados. Aí, na saída deles, botei minha irmã para morar e tô consertando. Tentei regularizar a situação na Secretaria de Habitação e na Caixa, mas não consegui.
O que diz Osmar Simões Pires, o Nico:
Não vendo casas, não sei do que tu tá falando. Eu lido com carreira, corrida de cavalo.
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