segunda-feira, 20 de julho de 2015

CRIMES E DOENÇAS NO MUNDO VIRTUAL

G1 FANTÁSTICO Edição do dia 19/07/2015


Cartões clonados, prostituição e pedofilia: crimes escondidos no mundo dos jogos online. Jovem de 21 anos conta que fez strip-tease para ter vantagens em game. Para comprar crédito, jogadores chegam a usar cartões clonados.





Tudo parece uma brincadeira inofensiva: passar de fase, ganhar poderes, ganhar prêmios e, assim, ir cada vez mais longe no jogo. O problema é que tem gente que não consegue parar. A brincadeira vira vício. E esse vício virtual abre portas para crimes bem reais, como prostituição, clonagem de cartão de crédito e até pedofilia.

Um mundo mágico, personagens fantásticos, superpoderosos, indestrutíveis. E você no controle de tudo. “Perdi, praticamente, todos os meus amigos, a minha faculdade eu tranquei”, conta uma jovem.

“Já cheguei até a 2, 3 dias sem tomar banho”, diz a aposentada Isabel Ferreira.

“Investi mais de R$ 500 mil”, revela o jogador que não ser identificado.

Mas quem são essas pessoas?

“Eles encontram na vida virtual muito mais satisfação social do que eles têm na vida real”, explica o psicólogo Cristiano Nabuco.

Estamos falando de jogos de internet, que acontecem em ambientes virtuais. O tempo que alguém dedica a esse mundo virtual é o principal sintoma de que algo não vai bem. O dia todo, a noite inteira ali dentro e a vida lá fora deixada de lado. O que começou como uma brincadeira se torna vício e por trás da relação doentia de milhares de pessoas com os jogos virtuais tem um lado oculto e bem real: o lado do crime.

“Aí já entra a questão do cartão clonado, pornografia, pedofilia”, afirma um homem que não quis ser identificado.

Em alguns jogos online, para avançar, passar de fases, é preciso cumprir tarefas. Conquistar armas e equipamentos, dar experiência aos personagens. Você só consegue isso com muito tempo ou muito dinheiro.

E quem não tem nenhum dos dois?

“Fazer poses, tirar a roupa, coisa erótica, coisa de homem mesmo”, conta uma jovem. Ela não quer mostrar o rosto por vergonha da família. A estudante de 23 anos não se intimidou na hora de tirar a roupa na frente da câmera do computador.

Fantástico: Você fez um strip-tease?
Jovem: Sim, fiz.
Fantástico: Tudo isso pelo jogo?
Jovem: Tudo isso pelo jogo.

Do outro lado da tela estava um jogador que prometia dar diamantes, que valem como moeda num dos jogos online, mas não era um jogador qualquer. Era também o que eles chamam de mediador.

Fantástico: O mediador está no jogo para quê?
Jovem: Mediador está lá para te ajudar na verdade.
Fantástico: E ele tem acesso a seus dados?
Jovem: Sim.

Os moderadores são contratados pelas empresas que controlam os jogos, principalmente onde esses games são bem populares, como no Brasil, Turquia e Estados Unidos. Eles devem ajudar os novatos a jogar e são um tipo de fiscal. Por isso, têm acesso a informações de todos os jogadores, inclusive fotos. Alguns se aproveitam desse poder para cometer crimes.

Um rapaz foi um desses moderadores e denuncia casos de pedofilia, envolvendo crianças que estavam jogando.

Moderador: No jogo tem um bate-papo, tem um chat, online, instantâneo. Você conversava normal. Pessoas anunciavam no chat, às vezes, que o moderador tinha solicitado foto da fulana X pelada para dar 100 diamantes, 200 diamantes. Então, isso era muito comum acontecer.
Fantástico: Com crianças?
Moderador: Com crianças.

Para se tornar um jogador importante nesses jogos online, parece não haver limites. Ícaro, no mundo real, é um publicitário que não mostrou o rosto. No mundo virtual, o primeiro colocado em um desses jogos online. Mas isso teve um preço alto.

Ícaro: Já cheguei a investir mais de R$ 500 mil.
Fantástico: R$ 500 mil?
Ícaro: Sim.

É isso mesmo! Ícaro gastou meio milhão de reais para equipar o personagem e se tornar o número um no jogo. Como prova dos gastos, ele nos mostrou o histórico recente de compras. De família rica e bem de vida, para ele dinheiro não é problema. No dia da entrevista, em apenas três horas, Ícaro tinha gastado R$ 2,5 mil em créditos.

Fantástico: Você é o número um. Você deve ser bem amado nessa comunidade.
Ícaro: Ah, sou bem amado e odiado ao mesmo tempo. Esse é um jogo que mexe com o ego.

Odiado porque revelou mais um crime nesse mundo virtual. Jogadores com bem menos dinheiro do que eles participam de uma fraude na compra dos tais diamantes que valem como moeda.

Ícaro: Cartão de crédito clonado, entre outras coisas.
Fantástico: E você conhece pessoas que fazem isso? Você sabe de pessoas que fazem isso?
Ícaro: Sei, sim.
Fantástico: Então, esse não é um mundo virtual apenas.
Ícaro: Não é. Exatamente.

Os diamantes que valem como créditos nos jogos são vendidos em sites de compra. Dependendo da quantidade, custam entre R$ 10 e R$ 2,1 mil, mas funcionários desses sites oferecem os diamantes pela metade do preço. Como? Os funcionários vendem os diamantes com desconto para os jogadores e ficam com o dinheiro. Depois, pagam às empresas pelo valor total com cartões clonados.

Fantástico: Mas cartão de quem?
Mediador: Ai que está, de quem que são os cartões? Os cartões são de várias pessoas, cartões clonados mesmo. São daquelas pessoas que, às vezes, abasteceu em um posto e sem querer o frentista foi lá e clonou o cartão.

O mediador negociou uma compra e guardou todos os e-mails que trocou com o funcionário do site de compra. As compras também são chamadas de recargas. O funcionário escreve: "Basta você fazer o pedido como se fosse comprar diamantes, normalmente, mas por boleto ou depósito. Vai pagar direto na conta que te mandar". Preocupado, ele pede aos clientes que sejam discretos: "Peço a todos que aguardem as recargas para não gerar transtorno e desconfiança entre os jogadores".

As autoridades dizem que nem sempre podem agir, porque os crimes não são denunciados. “A internet não é uma terra sem lei. As pessoas têm que acabar com esse mito de que na internet elas não são identificadas. São identificadas e devem ser punidas se praticarem crimes. O importante é denunciar”, afirma a procuradora-regional da República Neide de Oliveira.

É só um jogo. É virtual. Um clique e tudo desaparece. Desaparece? Não é simples assim. O chamado "transtorno por jogos de internet" entrou oficialmente no manual usado por psiquiatras do mundo todo para o diagnóstico de doenças mentais. E por um motivo simples: nada é real, mas as consequências do vício são. “Esses jogos são montados de uma maneira em que, nas fases iniciais, você consegue ganhar pontos de uma maneira muito fácil e rápida, exatamente, para mexer com a sua autoestima”, explica o psicólogo Cristiano Nabuco.

Foi o que aconteceu com uma jovem de 19 anos. Ela tinha acabado de ser aprovada para uma universidade federal. Entre o vestibular e o início das aulas, seis meses de espera. O jogo seria um passatempo, mas passou tempo demais. Por causa do vício, desistiu da faculdade. “É como se fosse uma droga. É um vício muito grande e as pessoas infelizmente não têm ideia, acham que é idiotice, acham que é bobagem, que é fase, mas não é”, diz.

Ela se isolou no quarto com o computador. Vida social, contato com amigos e com os próprios pais... “Eu perdi tudo. Eu perdi tudo. Eu tinha uma vida, ela parou. Parei minha vida por causa disso”, conta a jovem.

O caminho para vencer o vício é duro. É o que conta Isabel Ferreira, que precisou ser internada. Ela jogou por quatro anos sem parar. “Foram quatro anos de perda de tempo. Foram quatro anos de ilusão, de fuga da realidade”, relembra Isabel Ferreira.

Depois de brigar com a família e desenvolver problemas de saúde graves, Isabel procurou ajuda em uma clínica em Araçoiaba da Serra, no interior de São Paulo. Na semana passada, teve alta depois de oito meses de tratamento. Os passos seguidos por Isabel para se livrar do vício são os mesmos usados por grupos como Alcoólicos Anônimos. “Eu poderia ter resolvido apenas com sentar com a minha família ou conversar com a minha filha ao invés de fugir da realidade, fugir dos problemas”, diz Isabel.

Psiquiatras dizem que esse tipo de jogo seduz ainda mais quem está com a autoestima baixa. “A vida virtual se tornou uma vida tão interessante, ele é tão bem sucedido, tão querido, tão valorizado, que a realidade concreta se torna uma realidade sem graça”, explica o psicólogo Cristiano Nabuco.

Enquanto isso, a indústria de games cresce, e rápido.

Uma consultoria estima que o mercado de jogos movimente US$ 91 bilhões no mundo inteiro apenas neste ano. No Brasil, o mercado de games vai na contramão da economia e cresceu entre 9% e 15% nos últimos cinco anos. São milhões de brasileiros conectados e jogando online todos os dias.

“A dica qual é: seu filho quer fazer parte de um jogo? Ele quer utilizar o videogame pela internet? Não tem problema, você pode, pode até jogar com ele se for o caso. A questão fundamental é: estabeleça um horário e um tempo de duração”, recomenda Cristiano Nabuco.

Nesse mundo mágico de personagens fantásticos e indestrutíveis, o importante é manter o controle para ser só uma diversão, porque, sem controle, a pior das batalhas é ser sair do jogo.

Fantástico: Você não vai voltar a jogar?
Jovem de 19 anos: Não, não vou. Não quero, não vou e não tem quem faça.
Fantástico: Quanto tempo você já está sem jogar?
Jovem de 19 anos: Já tem uns quatro, cinco meses.
Fantástico: Isso aqui acabou, pode fechar?
Jovem de 19 anos: Pode fechar.
Fantástico: Tem certeza?
Jovem de 19 anos: Absoluta.

sábado, 9 de maio de 2015

O GOLPE DO INTERCÂMBIO

REVISTA ISTO É N° Edição: 2371 |  09.Mai.15 - 10:33



Empresário brasileiro tem escola na Irlanda fechada por irregularidades e deixa dezenas de jovens sem visto de estudante e sem dinheiro


Camila Brandalise



A possibilidade de estudar inglês e trabalhar em um país que permite acesso fácil a grande parte da Europa fez com que o mineiro Lucas Marçal, 28 anos, escolhesse a cidade de Dublin para um intercâmbio de seis meses. Tudo estava previsto para ele partir no dia 26 de julho deste ano, mas a pouco mais de dois meses do embarque, soube que a escola em que estudaria, a International Education Academy (IEA), cujo dono é brasileiro, fechou. “Já estou atrás de outra. Não tenho esperança de receber o dinheiro de volta.” De acordo com outros brasileiros que também fecharam contrato com a IEA – ou com seu braço em Itu, no interior de São Paulo, a I2 Intercâmbios –, o pacote promocional de seis meses de curso custava entre R$ 4,2 mil a 5,7 mil.


PROTESTO
Alunos durante manifestação após fechamento de escolas para estrangeiros
em Dublin, entre elas a IEA, onde estudavam muitos brasileiros

Diferentemente de Marçal, o paulista Vlad Beil Carreiro, 26 anos, vai adiar seus planos. “Investi R$ 3,4 mil no intercâmbio, passaria dois meses lá, mas não tenho como pagar outro pacote e vou cancelar a viagem.” A situação é ainda pior para quem já está morando na Irlanda. A reportagem de ISTOÉ entrou em contato com outros 15 brasileiros matriculados na escola e vivendo em Dublin que alegaram também terem sido lesados pela instituição. Muitos deles terão de voltar antes do previsto ou viver ilegalmente por não terem dinheiro para comprar outro curso e, consequentemente, não conseguirem solicitar o visto de estudante, impossível de se obter sem estar matriculado em um centro de ensino.

A Irlanda, e principalmente a capital, Dublin, é hoje um dos destinos preferidos dos brasileiros que querem passar uma temporada fora. Foi o país que apresentou o maior aumento em vendas de pacotes de intercâmbio no primeiro trimestre deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado, registrando um aumento de 30%, segundo a STB, líder brasileira no segmento de educação internacional. Com a grande procura, não só de brasileiros, escolas de idiomas surgiram aos montes no País, também conhecido pela facilidade na obtenção do visto se comparado a outros lugares, como Londres. Mas o cerco da imigração começou a apertar principalmente a partir deste ano, quando foram estabelecidas novas regras para concessão do visto de estudante, e como um efeito dominó, uma série de centros de ensino estão fechando suas portas. Os problemas são tanto em relação a exigências da imigração quanto a problemas financeiros. A IEA é a 14º instituição a encerrar os trabalhos desde abril de 2014 somente na cidade de Dublin. “Houve uma explosão de brasileiros por lá por uma série de fatores: o governo permite estudo com trabalho temporário e há muitas escolas baratas, que chamamos de aventureiras, que não tem compromisso com os alunos e fecham sem dar explicações”, afirma Marcelo Albuquerque, diretor financeiro da Brazilian Educational & Language Travel Association (Belta).


FUGA
O brasileiro José Amaral, dono da International Academy School, voltou para
o Brasil após escola ser acusada de fraudar documentos junto à imigração irlandesa

A IEA, que atendia cerca de 600 alunos, encerrou seus serviços em meio a uma denúncia de fraude junto à imigração irlandesa. A escola, como informa o Departamento de Justiça daquele país, ministrava aula de idiomas. Mas fornecia aos estudantes um documento de imigração no qual constava a matrícula no curso conhecido como CTH, da área de turismo e hotelaria. A informação é confirmada por alunos que dizem constar um tipo de curso no contrato e outro no documento a ser entregue às autoridades. A manobra foi criada porque a IEA não tem autorização para ministrar aulas de inglês para não europeus que solicitem o visto de estudante. Como explica Sue Hackett, gerente de educação internacional do Acels, órgão de certificação de qualidade de ensino ligado a uma agência estatal, há duas listas de cursos nos quais o aluno estrangeiro precisa estar matriculado para obter a permissão de estadia maior do que três meses. Da primeira, fazem parte os programas reconhecidos pelo Acels. Na segunda constam certificações como a CTH. A IEA não possuía esse selo Acels e, segundo Sue, nunca teve. Questionada sobre os motivos, a gerente afirma serem serem confidenciais, mas garante que os dirigentes da escola sabiam o motivo.



Dono da instituição, o brasileiro José Amaral afirma que a própria imigração orientou a escola a proceder dessa maneira enquanto não recebia o selo de qualificação. À reportagem, Amaral enviou um documento com uma avaliação positiva da IEA feita pelo Acels, onde constavam algumas ressalvas. Entre elas, a necessidade de a escola se adequar aos regulamentos da imigração e de matricular os alunos do curso de línguas no programa que, de fato, faziam parte. Sue Hackett reitera que qualquer escola pode ensinar outra língua para estrangeiros, a diferença é que o aluno não poderá solicitar o visto de estudante se não estiver em um centro de ensino certificado. Por causa desse imbróglio, a imigração irlandesa está barrando vistos de alunos da IEA, como no caso de Camila Pessoa de Aguiar, 26 anos, que já está em Dublin. “Fui à imigração duas vezes e disseram que a escola está sob investigação”, diz. O departamento de Justiça do País confirmou a informação à ISTOÉ. “Está claro que a escola estava oferecendo programa de línguas para estudantes não europeus sem ser autorizada para isso.” O empresário José Amaral, que em meio à crise e à pressão dos alunos e das autoridades voltou ao Brasil, alega que não recebeu nenhuma notificação. Diz ainda que só não foi certificado pelo Acels por preconceito, pelo fato de ele ser “o brasileiro que ajuda pobres a permanecerem no País”. “Estou sendo perseguido. Há um imenso esquema de corrupção no País que favorece um pequeno grupo de escolas e esse cartel quer que minha escola feche.”



Os alunos identificaram sinais de irregularidades antes de a IEA ser detida pelas autoridades irlandesas. “Percebi que havia algo errado no dia em que uma professora chegou na sala de aula desesperada pedindo para que, se alguém perguntasse se fazíamos curso de inglês, respondêssemos que não”, afirma José Wilker, 26 anos, que pagou por seis meses de aulas, mas cursou apenas sete dias. “Procurei o José Amaral, mas ele não respondeu nada do que perguntei e não aceitou a proposta de devolução de dinheiro ou transferência para uma outra escola”, diz. Wilker afirma que sua situação atual é a pior possível. “Meu visto de três meses de turista está para vencer, não tenho visto de estudante, estou sem escola porque meu contrato com a IEA foi rescindido e eles me deram o prazo de sete dias úteis para devolverem meu dinheiro, o que não aconteceu”, diz. Sem perspectiva, Wilker pensa em voltar para o Brasil. Em nota, a Embaixada do Brasil em Dublin afirma que está em contato com as autoridades irlandesas sobre o fechamento de escolas de inglês para tentar orientar os alunos brasileiros. “O governo irlandês criou um grupo de trabalho interministerial que deverá propor medidas com vistas à reforma do ensino de inglês no país.”



Foto: Sorcha Pollak/The Irish Times

sábado, 25 de abril de 2015

COMO SONEGAVAM IMPOSTOS NO RS

ZERO HORA 05/12/2014 | 16h52

por Eduardo Rosa


Como agia a organização criminosa que sonegava impostos no RS. Grupo voltado à comercialização de carnes movimentou R$ 250 milhões ao longo dos últimos 10 anos



Material apreendido foi levados à sede do Deic, em Porto Alegre Foto: Ronaldo Bernardi / Agencia RBS


A organização criminosa desarticulada em operação da Polícia Civil e da Receita Estadual na manhã desta sexta-feira tinha um propósito simples: driblar a cobrança de tributos no comércio de carnes.

Se o objetivo era simples, o esquema que possibilitou a movimentação de mais de R$ 250 milhões ao longo dos últimos 10 anos, além da sonegação de R$ 60 milhões em impostos, era complexo. Conforme a investigação iniciada há nove meses, foi observado que o crime era comandado por dois mentores e envolvia um frigorífico legalizado, duas ou três empresas de fachada e outros tantos "laranjas".

A quadrilha aproveitava o fato de o recolhimento de ICMS no setor de carnes ser feito no regime de substituição tributária — ou seja, o imposto é todo pago pela indústria, e não em diferentes etapas.

— Essa gangue criou uma indústria que recebia carne de outros Estados mas não a vendia, a repassava a outra empresa. Como, em tese, o imposto já estava pago pela indústria, que é a responsável, a carne ia para o varejo e os consumidores finais sem pagamento — afirma Paulo Amando Cestari, chefe da Divisão de Fiscalização e Cobrança da Receita Estadual.




Cestari detalha como foi arquitetada a fraude:

1. A carne vinha de outros Estados para um frigorífico do Rio Grande do Sul, que teria de pagar o ICMS ao vender o produto, mas não pagava, pois o imposto é cobrado na hora de comercializar a carne.

2. Em vez de a carne ser vendida, ela era repassada ao atacadista (uma empresa de fachada), sem o registro da transação.

3. O atacadista vendia ao varejista (supermercados e açougues, por exemplo) sem pagar o ICMS, já que isso deveria ter sido feito pelo frigorífico.

4. O fato de o frigorifico comprar um produto altamente perecível e não o vender começou a gerar desconfiança. Por outro lado, havia atacadistas fazendo as vendas sem terem realizado as compras.

5. Durante a investigação, também foi descoberto que a emissão de notas do frigorífico e de atacadistas eram feitas com o mesmo IP (número que identifica um ponto de acesso único na internet).

Para acabar com esse esquema, foram cumpridos 55 mandados de busca e apreensão em casas e empresas e 15 mandados de prisão temporária — 13 pessoas foram detidas e duas não haviam sido encontradas até o início da tarde. A Justiça deferiu pedidos da Polícia Civil como quebra de sigilo fiscal dos investigados e bloqueio de bens.

— Os crimes são formação de organização criminosa, falsificação de documentos, falsidade ideológica, sonegação fiscal e lavagem de dinheiro — diz o delegado Joerberth Nunes, titular da Delegacia Fazendária, vinculada ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic).

O lucro obtido com o esquema era usado para adquirir bens, como as dezenas de veículos apreendidos — vários com valores superiores a R$ 100 mil.

— Futuramente, a ideia é que sejam usados para ressarcir os cofres públicos, conforme a nova lei de lavagem de dinheiro e do crime organizado — complementa o delegado Daniel Mendelski.

Receita desconfiou de tentativa de quitar impostos com cheques furtados

A apuração dos fatos teve início quando a Receita Estadual constatou que empresas tentavam pagar impostos utilizando cheques furtados. Para que o pagamento fosse aceito pelo banco, os criminosos adulteravam as guias de arrecadação, colocando o nome do titular do cheque. Alguns varejistas também se beneficiavam do esquema. Além do prejuízo financeiro, grande parte da carne era imprópria para o consumo, por ser transportada e armazenada de forma precária.

A Operação Dariba, que significa "imposto" em árabe, contou com a participação de mais de 400 servidores estaduais — entre delegados, agentes e auditores fiscais — e apoio da Polícia Federal. Um mandado de prisão foi cumprido em Belém do Pará e os demais em 16 cidades gaúchas, incluindo Porto Alegre. Os nomes dos investigados não foram divulgados, e o prazo para que o inquérito policial seja remetido à Justiça é 30 dias.

*Zero Hora

terça-feira, 7 de abril de 2015

FRAUDE NA LAVOURA



ZERO HORA 07 de abril de 2015 | N° 18125


HUMBERTO TREZZI

Golpe com recursos do Pronaf terá pelo menos 10 indiciados


POLÍCIA FEDERAL CONCLUIU que dinheiro de empréstimos realizados por agricultores era desviado por associação de produtores. Estimativas apontam que movimentações chegam a R$ 79 milhões

O inquérito criminal que investiga fraudes em financiamentos do Programa Nacional de Desenvolvimento da Agricultura Familiar (Pronaf) no Estado, centradas no Vale do Rio Pardo, deve ter pelo menos 10 indiciados. A Polícia Federal concluiu que recursos desses empréstimos eram desviados por lideranças de uma associação de produtores rurais e teriam inclusive abastecido campanhas eleitorais.

Estimativas apontam que as movimentações irregulares chegaram a R$ 79 milhões e teriam atingido cerca de 6,3 mil agricultores. A checagem já localizou centenas de pessoas que podem ter sido vitimadas. A investigação, que começou em 2012, deve concluir os trabalhos este mês e apontará como envolvidos no golpe dirigentes da Associação Santa-cruzense de Pequenos Agricultores Camponeses (Aspac) e também funcionários graduados das agências do Banco do Brasil (BB) na região.

O inquérito é conduzido pelo delegado Luciano Flores de Lima, que evita comentar o caso. A amigos, ele tem dito que falta apenas um laudo pericial para concluir a investigação. É uma análise contábil requisitada ao BB, com movimentações nas contas dos suspeitos e das vítimas.

Dirigentes também cobravam taxas

Pelo menos três integrantes da Aspac, entidade ligada ao Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), devem ser responsabilizados por terem colocado nas contas da entidade recursos oriundos de financiamentos que foram contratados em nomes de agricultores filiados à associação. Dirigentes da Aspac também serão responsabilizados por cobrarem taxas dos agricultores em cima de cada financiamento intermediado junto ao BB. Alguns desses colonos, plantadores de fumo e milho, dizem que só descobriram os empréstimos feitos em seu nome anos depois de os contratos serem assinados.

Muitas vezes, o dinheiro do empréstimo era devolvido pela Aspac, quando o agricultor reclamava. Em vários casos havia demora. Os policiais vão mencionar no inquérito que algumas pessoas, desesperadas, teriam cometido suicídio quando descobriram débitos que juravam não ter contraído.

segunda-feira, 23 de março de 2015

O SONHO CORROMPIDO

ZERO HORA 23 de março de 2015 | N° 18110


EDITORIAL


 

Por sua condição de maior programa habitacional brasileiro nos últimos anos e responsável por cerca de um terço do total de construções de moradias no país em 2013, era previsível que o programa Minha Casa Minha Vida acabasse se prestando para todo tipo de distorção. O que surpreende, como demonstrou reportagem publicada ontem por este jornal, é a extensão das deformações que vão desde comércio irregular de unidades e má qualidade do material utilizado nas construções até influência de políticos e do tráfico de drogas na definição dos contemplados. São questões que precisam ser enfrentadas de imediato e com rigor para evitar um desgaste irreparável nesse programa social tão relevante. O sonho da casa própria não pode se transformar num pesadelo para quem já assegurou um teto ou aguarda por ele, nem pode ser boicotado pela negligência de quem tem o dever de zelar pelo uso responsável de verbas públicas.

Um aspecto particularmente preocupante é que, nas estatísticas oficiais, os problemas registrados significam um percentual mínimo. Mesmo em número reduzido, porém, o fato é que as distorções se acumulam. Começam nas crescentes interferências na definição dos contemplados, o que tende a frustrar quem aguarda a oportunidade de garantir um teto de forma impessoal, e se estendem aos problemas estruturais enfrentados por alguns novos proprietários, incluindo vazamentos e infiltrações. Não faltam, também, casos de burla à ética e à legislação, com potencial para causar danos que podem se tornar irreversíveis, prejudicando a todos.

O país, hoje diante de um caso emblemático de corrupção na maior de suas empresas públicas, não pode consentir que também programas sociais tão importantes sejam deturpados. A questão é que, onde há dinheiro público envolvido e faltam controles, surge sempre margem para desvios. É o que ocorre com frequência com as verbas de Previdência Social, com as destinadas à merenda escolar e ao Bolsa Família, entre muitas outras, o que não pode ser admitido.

O poder público não pode tolerar que programas relevantes como o Minha Casa Minha Vida, bancados por todos os brasileiros, sejam desvirtuados nos seus propósitos. Os organismos de fiscalização precisam mostrar que estão mais vigilantes.

domingo, 22 de março de 2015

UMA INVESTIGAÇÃO DE DUAS REDAÇÕES



ZERO HORA 22 de março de 2015 | N° 18109


CARTA DA EDITORA | Marta Gleich



Por trás da reportagem especial deste domingo, Minha Casa Minha Fraude, há bastidores que gostaria de compartilhar com nossos leitores.


Desde 2012, criamos em Zero Hora um Grupo de Investigação. Formado por repórteres e editores que se dedicam de forma especial a ser, como os americanos denominam, “watchdogs”, ou cães de guarda da sociedade, esse time pensa pautas, planeja a longo prazo e vai a campo investigar, em reportagens que algumas vezes significam investimentos de apuração e edição de até um ano.

Formado hoje pelos jornalistas Adriana Irion, Carlos Rollsing, Eduardo Torres (Diário Gaúcho), Humberto Trezzi, José Luis Costa, Maurício Tonetto e Rodrigo Lopes, o grupo de repórteres decidiu que o principal programa habitacional do governo federal, o Minha Casa Minha Vida, merecia uma investigação especial. O projeto tem muitos méritos, entre eles o de concretizar o sonho da casa própria a quem nunca teve a chance de dispor de um teto. Em 2013, foi responsável por um terço (32,1%) do total das construções de moradias do Brasil. O problema é que o programa governamental tem sido alvo de fraudes variadas, vendas irregulares e construções de má qualidade. Mais: em algumas cidades, o tráfico de drogas acossa a comunidade, alvo frequente de operações policiais.

A diferença nesta investigação é que ela foi produzida por repórteres investigativos de dois jornais do Grupo RBS: Humberto Trezzi e o fotógrafo Fernando Gomes, de ZH, e Ânderson Silva e a fotógrafa Betina Humeres, do Diário Catarinense – já que as fraudes não se restringem ao Rio Grande do Sul. Durante 40 dias, os jornalistas se debruçaram sobre documentos oficiais e bateram de porta em porta de condomínios construídos para o Minha Casa Minha Vida. Depararam com mau acabamento das construções (infiltrações, inundações, rachaduras) em prédios de Canoas, Porto Alegre, Sapucaia do Sul, Cachoeirinha, Novo Hamburgo e São Leopoldo. Constataram que em pelo menos oito cidades gaúchas de porte médio proliferam denúncias de comércio ou aluguel irregular de imóveis do programa governamental. Em Santa Catarina, aos problemas de infraestrutura e invasão, somam-se tráfico de drogas, prostituição e ameaça de morte em Blumenau e Palhoça. Cada um dos jornais publica neste domingo o mesmo tema, mas cada um com o enfoque adequado a seu público e sua zona geográfica. Essa soma de esforços traz ao leitor um conteúdo mais completo e mais aprofundado.

sábado, 21 de março de 2015

PROGRAMA SOCIAL TEM COMÉRCIO E ALUGUEL IRREGULARES

ZERO HORA 21/03/2015 | 08h07

31% dos imóveis do Minha Casa Minha Vida estão irregulares em cidade do noroeste gaúcho. Reportagem constatou diversos problemas com o programa durante 40 dias de investigações

por Ânderson Silva e Humberto Trezzi



Secretária Municipal de Habitação de Cruz Alta, Elisabeth Linck, tenta retomar as habitações ocupadas por pessoas não autorizadas Foto: Fernando Gomes / Agencia RBS

Está equivocado quem pensa que irregularidades no programa Minha Casa Minha Vida só ocorrem nas grandes cidades.

A reportagem constatou que em pelo menos oito cidades gaúchas de porte médio proliferam denúncias de comércio ou aluguel irregular de imóveis do programa governamental.

O pior caso encontrado acontece em Cruz Alta, no noroeste gaúcho. De 265 residências do programa construídas no loteamento Vida Nova II, pelo menos 82 não estão mais com os mutuários originais – foram repassadas para outras pessoas, sem autorização. Ou seja, um em cada três imóveis está em situação irregular. Com relação a 52 moradias, já foi formalizada denúncia para investigação por parte do Ministério Público Federal (MPF) e pela Caixa Econômica Federal. A prefeitura tem um dossiê a respeito das outras 30 casas. As denúncias foram feitas em junho de 2013 e maio de 2014.

– Chegamos a receber de 20 a 30 pessoas com reclamações na secretaria. Residências acabaram invadidas, inclusive servindo como abrigo de criminosos – afirma a secretária municipal de Habitação e Interesse Social de Cruz Alta, Elisabeth Linke.

Elizabeth diz que a Caixa ainda não se manifestou sobre o assunto. Ela aguarda avaliação do banco, uma reintegração de posse que viabilize repasse de imóveis invadidos a outras famílias.

– Temos muito interesse que o assunto seja resolvido, já que o município foi o doador da área onde se encontra o loteamento – explica.

Em fevereiro, ZH esteve em Cruz Alta e comprovou a facilidade com que casas são vendidas, alugadas e invadidas. Sem se identificar, os repórteres passearam pela Rua Maria de Lourdes Rousselet, uma das principais do loteamento Vida Nova II, verificando ofertas de residências para comprar. Na casa de número 93 daquela via, o carpinteiro Antônio Carneiro dos Santos admite que vende o imóvel por R$ 2 mil. Questionado por que o preço está baixo e se existem papéis legalizando o negócio, Carneiro é sincero.

– Olha, se tivesse papel eu cobrava R$ 15 mil. Na realidade, a casa não é minha, estou ocupando ela. O antigo morador era um mendigo, que vivia na rua. Entrei aqui com a família e vou ficando. Quero me mudar, em busca de emprego, e por isso vendo tudo por R$ 2 mil, incluindo móveis. Financiamento não tenho – admite.

A prefeitura de Cruz Alta informa que tramita contra Carneiro uma ação judicial de despejo, porque ele invadiu a casa de um mutuário, Jorge da Rosa Santos.

Duas ruas lomba acima, na Rua Victório Della Mea, dona de um pequeno armazém, Jaque admite que o marido, conhecido como Nico, medeia venda de casas no loteamento. Nico é o apelido de Osmar Simões Pires.

– Quando sabe de alguém interessado, ele ajuda a vender. Tem casa por R$ 3 mil, R$ 4 mil, R$ 5 mil. Aí tu faz um contrato de gaveta e fica pagando a prestação, que é baixa, em torno de R$ 40 mensais. Aquela casa ali em frente foi o Nico que vendeu – aponta.


Na mesma rua, em outra parte do loteamento, a reportagem encontra a moradora Dejanira Fátima da Cunha Ferreira entrando na casa 51, que parece abandonada. Ela admite que não é a dona e que ocupou a residência quando a mutuária original se mudou para Vacaria. O imóvel está depredado, repleto de detritos e sem parte do forro, mas Dejanira diz que arruma o local para colocar uma irmã ali.

– Tentei me legalizar na Caixa Federal, mas ninguém me ajudou. Aí vou ficando. Melhor que deixar drogados ocuparem a casa – justifica ela.

A prefeitura informa que Dejanira foi denunciada à Caixa em 2013 por invasão de três residências do Minha Casa Minha Vida, nas quais colocou familiares.

O MPF abriu inquérito para apurar as invasões, aluguéis e vendas em Cruz Alta.

CONTRAPONTOS

O que diz Antônio Carneiro dos Santos:
Não tenho documento do imóvel, entrei aqui porque o antigo morador saiu. Até por isso, cobro apenas R$ 2 mil e quem comprar leva meus móveis também.

O que diz Dejanira Fátima da Cunha Ferreira:
A casa vivia ocupada por drogados. Aí, na saída deles, botei minha irmã para morar e tô consertando. Tentei regularizar a situação na Secretaria de Habitação e na Caixa, mas não consegui.

O que diz Osmar Simões Pires, o Nico:
Não vendo casas, não sei do que tu tá falando. Eu lido com carreira, corrida de cavalo.

MINHA CASA, MINHA VIDA À VENDA...

ZERO HORA 21/03/2015 | 08h06

Beneficiados fazem venda ilegal de apartamentos do Minha Casa Minha Vida. Reportagem constatou problemas com o programa durante 40 dias de investigações

por Ânderson Silva e Humberto Trezzi




Condomínio Planalto Canoense, no Bairro Olaria, em Canoas, conta com apartamentos à venda Foto: Fernando Gomes / Agencia RBS

É fácil comprovar o fosso entre a intenção governamental e a prática, no programa Minha Casa Minha Vida. Inaugurado em 2011, o condomínio Planalto Canoense, em Canoas, virou campo fértil para irregularidades. Basta perguntar para moradores quem tem imóvel para vender, como fez a reportagem na última semana de janeiro.

Um grupo de habitantes do condomínio, reunido à sombra de uma árvore, descreveu de imediato quatro apartamentos de dois dormitórios que estão à venda, mesmo sem estarem quitados. Dois no Bloco J, um no Bloco K, um no Bloco I. A equipe de reportagem encontrou, em uma janela do bloco B, cartazes feitos à mão, que anunciam: “Vende-se, tratar fone...”.

O problema é que esses apartamentos são financiados pela faixa I do programa Minha Casa Minha Vida. É a mais baixa, até R$ 1,6 mil de renda familiar. Por isso, o governo proíbe que os imóveis sejam vendidos antes da quitação do financiamento, uma maneira de garantir que o programa alcance sua finalidade: atender pessoas de baixa renda, que jamais conseguiriam, de outra forma, ter casa própria. No entanto, não é difícil encontrar gente disposta a burlar as regras.

A reportagem bateu na porta do apartamento 233 do bloco I do Planalto Canoense e fez uma pergunta simples:

– Está à venda?

– Sim – respondeu a dona de casa Elisandra Soares. – Basta assumir as prestações, de R$ 37 mensais. Faltam quatro anos para pagar, ainda, antes de poder quitar o financiamento da Caixa Econômica Federal – avisa ela.

A prática é ilegal: a Caixa só autoriza venda de imóveis quitados, nessa faixa do programa.

– Mas fica em nome de quem? É preciso um contrato de gaveta, então? – insiste o repórter.

Elisandra confirma:

– Sim, você nos passa um dinheiro. Depois recebe, todo mês, uma prestação em nosso nome, para saldar.

Ela não soube dizer quanto seria o valor desejado pela venda, mas aconselhou que falássemos com seu marido, Cristiano Ferreira. Metalúrgico, ele atende ao telefone, sem saber que falava com repórteres. Perguntamos sobre o apartamento à venda e quanto deseja:

– Uns R$ 60 mil... e que assumam as prestações que faltam – responde Cristiano.

– O apartamento vai ter de continuar no nosso nome. Só posso passar pro nome de vocês depois de 10 anos. Fazemos um contrato de gaveta. Dependendo da negociação, dá para baixar o preço. Já tenho para onde ir...

Imobiliárias trabalham com imóveis não quitados

Questionado se não daria problema vender imóvel do Minha Casa Minha Vida, ele diz:

– Olha, meu, tem gente vendendo... Até o ex-síndico vendeu.

O diretor de Habitação da Caixa, Teotônio Rezende, tem dito em entrevistas que a comercialização do imóvel do programa sem a respectiva quitação é nula e não tem valor legal. Quem vende fica obrigado a restituir integralmente os subsídios recebidos e não participará de mais nenhum programa social com recursos federais. Já quem adquire irregularmente perderá o imóvel. Por que isso? Para priorizar quem necessita de moradia, não quem usa o imóvel para lucrar.

Localizado na Rua Zulmiro Gomes da Silva, número 100, bairro Olaria, o Planalto Canoense é composto por 12 prédios de cinco pavimentos. Eles têm 240 apartamentos financiados pelo Minha Casa Minha Vida – mas só 92 pagam condomínio. É que problemas construtivos, invasões e venda ilegal dos imóveis resultam em alto índice de inadimplência, tanto com as prestações do financiamento quanto com a administradora dos imóveis. A reportagem comprovou que também imobiliárias trabalham com imóveis não quitados do Minha Casa Minha Vida. A Conter Imóveis, de Canoas, oferecia no final de janeiro um apartamento de dois dormitórios no Planalto Canoense, por R$ 127,7 mil, mais de 10 vezes o que a Caixa costuma cobrar do mutuário. Contatada, a corretora Camila confirmou a oferta. Questionada se não há impedimento à venda de imóvel não-quitado nessa faixa do Minha Casa Minha Vida, ela sugeriu um truque ao comprador:

– Se não tiver quitado o imóvel, o dono vai dar quitação. Vamos supor que esteja financiado, essa pessoa, com o dinheiro que vai entrar no negócio, ela quita e vende. E você assume o financiamento.

A Caixa avisa que, para que não fique caracterizada irregularidade, antes de anunciar o imóvel à venda, o beneficiário deverá proceder a quitação do financiamento. Não foi o que ocorreu no caso da imobiliária de Canoas.

– Caso oferte o imóvel à venda ou para aluguel, antes da quitação da dívida, ou ainda se firmar “contrato de gaveta”, estará caracterizada a irregularidade. Neste caso, a Caixa pode pedir na Justiça a retomada do imóvel – alerta Rezende.


CONTRAPONTOS

O que diz Cristiano Ferreira, morador do condomínio Planalto Canoense:
Mas até o síndico vendeu...Eu sei que é proibido vender, mas ainda não vendi. Então não cometi o crime.

O que diz Francisco Conter, administrador da Conter Imóveis:
Sua informação é nova para nós, eu desconhecia que não pode anunciar imóvel do Minha Casa (faixa 1) não quitado. O imóvel já não deve mais aparecer em divulgação. Estamos verificando se foi anunciado em algum outro veículo de divulgação para também fazer a retirada.

quarta-feira, 18 de março de 2015

FRAUDE NA COLETA DE LIXO NO RS

ZERO HORA 17/03/2015 | 20h03

Entenda como funcionava a fraude na coleta de lixo do RS, que envolve contratos de R$ 5 milhões. Seis empresários foram presos nesta terça-feira e servidores públicos devem ser investigados na próxima fase da ação

por Fernanda da Costa



Um dos locais onde foram cumpridos mandados Foto: Ministério Público / Divulgação


As fraudes nos sistemas de coleta de lixo do Rio Grande do Sul reveladas nesta terça-feira pelo Ministério Público, que envolvem contratos de R$ 5 milhões em 12 cidades, são como a ponta de um grande iceberg de desvios. Depois de prender seis empresários, a investigação agora tem novo foco: o suposto envolvimento de servidores públicos.

Iniciada em meados de 2014, após um empresário envolvido revelar o esquema ao Ministério Público de Contas, a operação, batizada de Conexion, está apenas em sua primeira fase. Conforme o órgão, a fraude envolve a formação de cartel por 25 empresas, que fraudaram licitações para superfaturar o serviço de coleta de lixo.

Nesta fase, o MP indicou o superfaturamento em contratos de pelo menos R$ 5 milhões, em 12 municípios gaúchos, entre eles Palmares do Sul, Tavares, Santo Antônio da Patrulha e Novo Hamburgo. Em uma das contratações emergenciais, o superfaturamento chegou a 100%. A investigação ressaltou que ainda há muitos documentos para serem analisados.

— O número de cidades com contratos superfaturados vai crescer muito. Vamos aprofundar as investigações e examinar outros contratos em que há fortíssimos indícios da ação desse cartel — informou o promotor Ricardo Herbstrith.

A primeira fase das investigações serviu para o cumprimento, nesta terça-feira, de sete mandados de prisão preventiva e 18 de busca e apreensão, em 12 cidades. Seis empresários foram presos na ação: dois em Tramandaí, um em Torres, um em Taquara, um em Porto Alegre e um em Arroio do Meio. O outro empresário, de Parobé, segue foragido. Os presos foram encaminhados para a Penitenciária Modulada de Osório, no Litoral Norte.

Entre os presos está o empresário que revelou o esquema. Eles devem responder pelos crimes de fraude a licitação, lavagem de dinheiro e formação de cartel. Os nomes dos detidos não foram revelados pelo MP, que deve divulgá-los apenas depois que eles forem denunciados. O órgão planeja encaminhar as denúncias à Justiça na quarta-feira da próxima semana.

Servidores públicos e donos de aterros serão investigados

A suspeita de envolvimento de servidores públicos e donos de aterros sanitários no esquema será investigada na próxima fase da operação, ainda sem previsão de término. Herbstrith não confirmou se políticos também serão investigados.

— Os agentes públicos participam desse tipo de esquema quando fecham os olhos para o superfaturamento, dificultam a entrada de empresas que não fazem parte do cartel ou apertam a fiscalização contra elas — explicou Herbstrith.

Nesta terça-feira, foram cumpridos mandados em Novo Hamburgo, Porto Alegre, Tramandaí, Igrejinha, Canela, Torres, Santo Antônio da Patrulha, Alvorada, Taquara, Carlos Barbosa, Parai e Arroio do Meio. A lista de cidades onde houve superfaturamento de contratos, no entanto, não foi divulgada pelo órgão.

Também foram apreendidos computadores, celulares, atas de reuniões, agendas, diversas documentações referentes a licitações já realizadas e a pregões em andamento, além de R$ 17 mil.

Além do depoimento de um dos empresários, o MP utilizou interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça para desvendar o esquema. Conforme o MP, entre as empresas suspeitas de participarem do cartel estão Mecanicapina e W.K. Borges, de Porto Alegre; Onze Construtora e Urbanizadora, Brisa Transportes e Trans Ambiental, de Tramandaí; Geral Transportes, de Canela; Biomina e Camaro, de Taquara; Komac Rental, de Torres; Eco Limp, de Santo Antônio da Patrulha; Biasotto & Cia, de Carlos Barbosa e Reciclagem Adeva, de Paraí.

Como funcionava o esquema

— Vinte e cinco empresas se associaram criminalmente com objetivo de fraudar licitações para superfaturar contratos e dividir o mercado entre elas.

— Para o êxito das ações, o grupo fundou, em 2009, a Associação Gaúcha das Empresas de Limpeza Urbana (Agelurb), sediada em Novo Hamburgo.

— No local, empresários realizavam reuniões mensais para determinar qual das empresas seria vencedora da próxima licitação ou alvo de contratação emergencial.

— Quando fraudava licitações, o cartel se articulava para que concorrentes não conseguissem atender os itens previstos no edital.

— O grupo criminoso também trabalhava para forçar a quebra de contratos de municípios com concorrentes fora do cartel.

— O mercado era dividido por regiões, em que cada empresa ficava responsável por um grupo de municípios próximos.

CONTRAPONTOS

Por meio de nota, o Grupo Mecanicapina (das empresas Mecanicapina e W. K. Borges) afirmou que "jamais pactuou com qualquer tipo de ilicitudes" e que "irá empreender todas as medidas cabíveis para que a verdade dos fatos prevaleça", colaborando com a investigação.

A secretária da Onze Construtora e Urbanizadora relatou que apenas os diretores poderiam falar sobre a operação, mas eles não estavam na empresa à tarde. A companhia não disponibilizou telefones ou e-mails para contato com os responsáveis.

Também não havia nenhum responsável pela Brisa Transportes no local à tarde. Zero Hora entrou em contato com a empresa por e-mail e ainda aguarda resposta. Na Geral Transportes e na Biasotto, ninguém atendeu as ligações da reportagem. O jornal entrou em contato com a Biasotto por meio do formulário de atendimento disponível no site da empresa, mas ainda não recebeu retorno.

A reportagem não conseguiu localizar contatos das empresas Trans Ambiental, Biomina, Camaro, Komac Rental, Eco Limp e Reciclagem Adeva na internet. Essas empresas também não possuem telefones registrados no site TeleListas.Net.

segunda-feira, 9 de março de 2015

GOLPISTAS NIGERIANOS USAM INTERNET PARA EXTORQUIR MULHERES APAIXONADAS

G1 FANTÁSTICO Edição do dia 08/03/2015

Golpistas nigerianos usam internet para extorquir mulheres apaixonadas. Brasileira achou que namorava publicitário e perdeu R$ 240 mil. Bandido nigeriano se passava por viúvo inglês na internet.






Uma viúva de meia-idade, sozinha e carente, decide procurar na internet um novo amor. Encontra um homem que parece o príncipe dos sonhos: atencioso, apaixonado e bem de vida. Só que ele está precisando com urgência de um dinheiro emprestado. Está sentindo cheiro de picaretagem nessa história?

“Eu tinha acabado um relacionamento há oito meses. Trabalho muito e estava sozinha. Falei assim: ‘Ah, pode ser que pela internet dê certo’”, diz uma mulher.

Assim começa a história de mais um coração solitário. Essa mulher é viúva, mãe de família. Os dias de juventude se foram e ela trabalha muito.

“Fui para um site de relacionamento, e lá ele apareceu e iniciou o contato”, conta a mulher.

Por e-mail e com fotos.

“Meu nome é Lucas, tenho 53 anos. Sou um viúvo com uma filha que está no colégio interno e mora longe de casa. Eu moro e trabalho no Reino Unido, em Bristol, precisamente. Trabalho numa agência de publicidade e logo, logo vou ter meu próprio negócio”, descreve o e-mail.

Ela conta um pouco da própria história, e a coisa vai ficando intensa.

“No início era uma vez por semana. Depois, todos os dias”, diz ela.

Sempre por mensagens, via computador ou telefone. Mais de uma vez ela pediu para que conversassem usando câmera.

“Aí ele falou: ‘o meu tempo está muito corrido. No momento eu não posso’”, lembra a vítima.

Um dia, o bonitão vem com uma supernotícia, o primeiro passo em direção à riqueza.

“Consegui um contrato para fazer um anúncio na TV de uma multinacional de telecomunicação, que vai ser na Nigéria. Estou tão feliz! Você está sempre nos meus pensamentos”, diz no e-mail.

“Passou-se uns dias e ele mandou uma foto: ‘olha, estou aqui no jardim do hotel, e amanhã já estou indo embora’”, conta a vítima.

É aí que a história começa a degringolar. Ele diz que o governo nigeriano baixou uma lei sobre impostos para estrangeiros. Se não pagar, vai preso.

“Me assustei um pouco, mas ele é muito convincente, muito envolvente, muito carinhoso, muito dedicado”, diz ela.

A mulher pega empréstimos. Passa a enviar dinheiro aos poucos. Mas, a cada remessa, surge um novo problema, que só pode ser resolvido com mais dinheiro.

“Ele manda uma foto pra mim dele preso”, diz a mulher.

A montagem na foto é tão tosca, que finalmente ela começa a desconfiar.

“Falei assim: ‘entrei num golpe’”, lamenta.

Golpe do namoro online é uma das variações de uma falcatrua antiga

Tarde demais. Ao longo do ano passado, ela já tinha mandado US$ 100 mil, o equivalente, na época, a R$ 240 mil.

A certeza mesmo só veio quando ela viu uma reportagem sobre esse mesmo golpe no Fantástico, três meses atrás.

“Eu falei: ‘eu sou mais uma dessa’”, diz a vítima.

Mas por que essa armação criminosa é tão bem-sucedida na internet? Por causa da fantasia, como explica o psiquiatra Cristiano Nabuco de Abreu especializado em dependência tecnológica: “Se você começa a manifestar um interesse por alguém na vida real, rapidamente ela vai confirmando ou desconfirmando as suas expectativas pessoais”, diz o psiquiatra do Hospital das Clínicas de SP.

Pela internet é mais fácil a pessoa acreditar em um relacionamento perfeito.

“Eu simplesmente vou passando por cima de todos os elementos que possam desconfirmar a minha fantasia”, explica o psicólogo.

O golpe do namoro online é uma das variações de uma falcatrua muito antiga. Os primeiros registros são do século XVI, quando os espertinhos usavam cartas para arrumar dinheiro.

No caso dessa mulher, o que muda agora é que, em uma atitude incomum, o golpista decidiu mostrar o rosto.

Orientada por um especialista, ela jogou uma isca.

“Se você aparecer pra mim, eu tenho US$ 10 mil aqui pra você”, disse a vítima.

E lá está o tal Lucas, que agora se chama Chuks.

“Minha querida... Você tá linda!”, diz Chuks no vídeo.

Como Chuks não sabe que ela está gravando o papo, abusa da criatividade para tentar tirar mais dinheiro da vítima. Diz que investiu todo o dinheiro dela em petróleo.

“O navio que usei para transportar o produto foi capturado por militantes. Envolve muito dinheiro, na casa dos milhões. Tenho que pagar aos poucos até poder voltar ao negócio”, conta o golpista.

Especialista em segurança digital rastreia endereço do computador

Mas por que ele se apresentava como um publicitário, inglês, branco? Chuks, então, responde que sempre que tentou falar a verdade na internet, as mulheres não quiseram papo.

“Por isso menti e inventei histórias, com uma foto falsa”, justifica.

Agora, diante da câmera, ele dá uma de galanteador.

“Você me ama de verdade. Não liga se eu sou branco ou negro. Você me quer”, garante o golpista.

“Sim”, responde a vítima.

E se despede amoroso.

Vítima: Tchauzinho
Chuks: Te amo.
Vítima: Te amo. Boa noite.

A pedido do Fantástico, um especialista em segurança digital rastreou o endereço do computador do bandido. O golpista estava bem longe da Inglaterra, na Nigéria.

“Eles sempre agem em quadrilhas. Eles têm todo um roteiro muito bem definido", explica Wandeson Castilho, especialista em segurança digital.

Existem muitas quadrilhas nigerianas aplicando esse golpe no mundo todo.

Há casos que terminam em sequestro ou em morte, como o de uma senhora australiana que perdeu R$ 270 mil para um criminoso nigeriano e foi assassinada. Por isso a brasileira teve muita sorte.

Dicas para não ser vítima desse golpe

Antes de descobrir a verdade, ela chegou a ir à Espanha para supostamente tentar liberar o dinheiro dele. Hospedou-se em um hotel indicado pelo bandido e recebeu a visita de um amigo dele. Para ajudar o "namorado", ela teria que abrir uma conta na Europa e, claro, gastar mais dinheiro.

“Eu teria que ser uma cidadã europeia para conseguir abrir uma conta lá, então eu teria que pagar US$ 38 mil para conseguir ser uma cidadã europeia”, revela a vítima.

Ela voltou ao Brasil, pegou mais um empréstimo e mandou o dinheiro. Cerca de R$ 90 mil na época.

“Hoje eu estou sem dinheiro e isso me tortura”, lamenta.

A vítima do golpe registrou o boletim de ocorrência em uma delegacia da Polícia Civil de Fortaleza, dois meses depois de enviar a última remessa de dinheiro.

Segundo o delegado, o caso vai ser encaminhado à Polícia Federal.

“Ela veio comunicar o crime quase um ano após ter sido envolvida nessa trama. Mas, sem sombra de dúvida, nós podemos sim procurar identificar o autor”, diz Jaime Pessoa, da Delegacia de Defraudações e Falsificações do Ceará.

O Fantástico contatou a embaixada da Nigéria em Brasília, em busca de possíveis informações sobre a identidade do criminoso, mas ninguém quis se manifestar.

Para não ser vítima desse golpe, aí vão duas dicas.

A primeira: converse usando câmera.

“Se já aparecer alguns problemas técnicos, ‘ah, eu não tenho câmera, minha câmera não funciona’, já desconfie”, orienta Wandeson Castilho, especialista em segurança digital.

E cuidado com quem pede dinheiro.

“Se começar a aparecer histórias muito tristes, e que você poderia ser o salvador para se ajudar, isso é característico: é o roteiro desse tipo de crime”, alerta Wandeson Castilho.

segunda-feira, 2 de março de 2015

FINGINDO DE DOENTE PARA ARRECADAR DINHEIRO PELA INTERNT

G1 FANTASTICO Edição do dia 01/03/2015

Skatista finge doença e arrecada dinheiro pela internet. Estudante Luma Cardoso convenceu colegas de turma a doarem dinheiro da festa de formatura para o rapaz. Ele diz estar arrependido e pede perdão.




O skatista do Piauí que forjou estar doente para conseguir dinheiro para um falso tratamento pede perdão às vítimas.

Numa entrevista exclusiva ao Fantástico, ele disse que está arrependido e chegou a ficar frente a frente com uma moça que doou o dinheiro da formatura para ele.
A conversa foi tensa.

O skatista Zacarias Godim postou um vídeo que circulou durante 15 dias na internet. Ele dizia que tinha leucemia aguda. Que a médica pediu para ele tratar a doença em São Paulo porque no Piauí não faz transplante de medula óssea e pedia ajuda financeira.

Luma Cardoso viu o vídeo e foi à casa do surfista. Convenceu todos os colegas a doar todo o dinheiro da festa de formatura ao Zacarias. Até uma ONG ajudou a divulgar a campanha.

A farsa foi descoberta. Uma médica viu sua assinatura no laudo sobre a doença de Zacarias.
O advogado Fabiano Nogueira disse que quando fez o vídeo ele achava que estava doente. Ele já tinha recebido o dinheiro quando recebeu o resultado dos exames. Ele não sabia o que fazer.
Diz que arrecadou R$ 23 mil e que gastou R$ 50 do dinheiro. Ele pediu perdão.
“Queria agradecer a todo mundo e pedir perdão a todo mundo de coração”.

Luma ficou frente a frente com ele:

“Você me enganou. Eu sofri junto contigo.”, diz Luma

Luma conta que por causa dele algumas pessoas a ofenderam na escola e que queriam a festa de volta.

“Eu fiquei com raiva de mim. Quando eu recebi o exame fiquei sem saber o que fazer. Aí desesperado eu fiz isso. Você me perdoa?”, diz Zacarias.

“Eu não tenho raiva, mas falar que te perdoo aqui seria da boca para fora. Você prejudicou muita gente que necessita,” diz Luma.

“Zacarias deve responder por estelionato e pela falsificação de documento público. A pena é de 1 a 6 anos de prisão. A Justiça vai decidir a quantia que será devolvida a cada pessoa que contribuiu para a campanha, diz o delegado-geral do Piauí, Riedel Batista.

“Eu espero ter de volta esses R$ 450 para realizar a nossa festa”, resume Luma.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

ADVOGADOS SÃO ACUSADOS DE DAR GOLPE EM APOSENTADOS RURAIS

G1 FANTÁSTICO Edição do dia 25/01/2015


Trabalhadores rurais são obrigados a entregar parcelas atrasadas de benefício por meio de contratos abusivos.





A reportagem especial do Fantástico conta a triste história de trabalhadores rurais, gente muito humilde, que esperou meses, até anos, para receber a aposentadoria a que tinha direito.

Só que nessa espera eles foram enganados por advogados espertalhões. Vários desses advogados já foram condenados, outros, acusados por tirar proveito da falta de informação dessas pessoas para ficar com o dinheiro delas, sem nenhuma vergonha.

É difícil de acreditar: lavradores, que trabalham duro debaixo do sol para botar comida na mesa dos outros, muitas vezes, não tem comida na própria casa.

“A gente passa muita falta, Nossa Senhora. Deus me perdoe, eu falei. É um pecado a gente falar, mas a gente passa até fome”, conta Dona Iracema.

Geraldo Balbino: Ficou difícil. Faltava as coisas dentro de casa.
Rita Balbino: Chegava alguém e falava "Rita, você não vai fazer comida? Falava, eu não tenho nada para fazer

As histórias são parecidas. Essas pessoas foram atraídas por advogados que prometeram conseguir para elas as aposentadorias pelo INSS a que tinham direito. Eles até conseguiram se aposentar. Mas acabaram mal.

Para você entender: o pequeno trabalhador rural pode pedir aposentadoria por invalidez ou idade, 60 anos para os homens, 55 para as mulheres. Às vezes, o pedido vai parar na Justiça, e aí a decisão pode levar um ano, dois, até mais, dependendo da burocracia. Quando o juiz determina o pagamento da pensão, o trabalhador tem direito a receber também pelo tempo que ficou esperando desde que fez o pedido.

Por exemplo, se a decisão demorou dois anos para sair, o aposentado tem direito a receber os 24 meses. São os chamados atrasados ou retroativos. Mas quem está botando no bolso os atrasados são os advogados, pela cobrança de honorários considerados extorsivos. Eles são alvos de um processo do Ministério Público Federal.

No interior da Bahia, 28 advogados foram denunciados na Justiça Federal por essa cobrança abusiva.

Idosos, incapazes, pessoas de baixa ou nenhuma escolaridade que moram em comunidades pobres da zona rural como no sudoeste baiano. Eram os clientes preferidos dos advogados. Pelo trabalho advocatício, em causas previdenciárias, eles cobraram valores muito acima do que a Justiça considera razoável.

Aos 64 anos, Dona Ercília, apesar de aposentada, ainda vai para a roça ajudar o marido. “Eu planto para me ajudar pelo menos no feijão, a raizinha da mandioca, o milho verde para fazer um mingau”, conta Ercília Rodrigues, aposentada.

Remédios para pressão alta, osteoporose, dores na coluna. Dona Ercília achava que ficaria livre das dívidas que tem na farmácia.

Ercília Rodrigues: Estou devendo muito. Como eu já chorei por causa de dívida.
Fantástico: Esse dinheiro que ele levou a mais daria para pagar pelo menos as dívidas?
Ercília Rodrigues: Com certeza.

Foram R$ 12 mil de retroativo. Ela só recebeu a metade.

Ercília Rodrigues: Eu fui iludida. Não foi falado que a metade para eu dar para ele não.

O Fantástico encontrou o advogado de Dona Ercília: Romilson Nogueira, um dos 28 advogados denunciados.

Fantástico: Quanto é que o senhor cobra de honorários?
Romilson Nogueira: O que o estatuto da ordem fala: 20%.
Fantástico: Sempre foi assim? O senhor nunca cobrou mais do que isso?
Romilson Nogueira: Sempre foi assim.
Fantástico: Nós temos o depoimento de uma pessoa que garante que lhe pagou metade do que recebeu das parcelas atrasadas.
Romilson Nogueira: Nós trabalhamos com 20% que é o estatuto da OAB determina.

De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal, Romilson Nogueira cobrou mesmo 50% de Dona Ercília.

“O próprio Código de Ética da OAB determina que esses honorários sejam fixados de forma moderada. Portanto, nenhum motivo justifica a fixação de honorários em patamares de 50%”, diz o procurador da República Victor Cunha.

“E deve ser fixado um percentual razoável tendo em vista a situação de carência desse cidadão”, afirma o corregedor nacional da OAB Claudio Stabile.

Mas existem casos que vão muito além dos 50%. O Fantástico descobriu no interior da Bahia que aposentados foram obrigados a entregar, além de parcelas atrasadas, parte do benefício. Ou seja: dividir com o advogado a aposentadoria de um salário mínimo.

Os recibos, mostrados no vídeo acima, são de cobrança emitidos pelo próprio advogado do Pedro. Ele foi aposentado por invalidez porque tem Doença de Chagas.

“Falta de ar. Batimento, até o coração faz assim. Se eu fizer qualquer movimento eu me sinto mal”, conta Pedro Baleeiro, aposentado.

Ele diz que só não passou fome porque os parentes ajudaram. Com a metade da aposentadoria, mal conseguia comprar os remédios.

Fantástico: Você recebia o dinheiro no banco e levava no escritório dele?
Aposentado: Dividia na mesa, assim. Contava: o seu é esse, tome.
Fantástico: E os atrasados também você recebeu...
Aposentado: Dividido também.
Fantástico: Deu o quê, R$ 16 mil?
Aposentado: Foi. Dividido por dois
Fantástico: Ele ficou com R$ 8 mil.

O Fantástico encontrou o advogado na cidade de Urandi, divisa da Bahia com Minas. É Fábio Oliveira de Souza.

Fantástico: Essa assinatura aqui é sua?
Fábio Oliveira de Souza: Sim.

Diante das provas ele não conseguiu negar a cobrança e tentou explicar.

“A gente é livre para trabalhar e elas são livres para contratar. Ninguém está forçando, diz o advogado Fábio Oliveira de Souza.

Fantástico: E para a sua consciência isso está resolvido, está justo? Você dorme tranquilamente, sem problema?
Fábio Oliveira de Souza: Deixa eu falar uma coisa para você. Isso é uma questão de foro íntimo, não posso dizer para você.

O Fantástico entregou ao procurador da República, em Guanambi, cópias dos recibos emitidos pelo advogado. “Entendo que essa prática, além de ser maléfica, é abusiva”, diz o procurador da República.

Descendo até Minas Gerais, chegamos a São João Del Rei. No local, mora Seu Domingos, que perdeu as pontas dos dedos moendo cana. Ele tinha direito a R$ 9,3 mil de atrasados. Mas nunca viu a cor desse dinheiro. E procurou o advogado para saber por quê.

“Ele pegou e falou que o direito era dele, dos atrasados, dez salários e 35%. Ele ainda falou que se fosse cobrar atualmente o valor certo, que eu ainda ficava devendo para ele”, conta o aposentado Domingos Sales de Sá.

O advogado sacou todo o dinheiro e ficou com tudo. Aliás, quase tudo.

“Depois ele ainda falou 'sobrou R$ 20 para você”, conta o aposentado.

R$ 20, dos R$ 9,3 a que tinha direito. Segundo o advogado, tudo acertado em contrato assinado pelo lavrador semianalfabeto. A gente tem pouca leitura, o sujeito manda a gente assinar, eu assinei”, conta Domingos Sales.

Os advogados que cuidaram do processo do Seu Domingos são dois sócios: Leonardo de Almeida Magalhães e Matheus Bevilacqua Campelo Pereira.

Eles também advogaram para Dona Iracema, de 72 anos, que tinha direito a receber R$ 20,8 mil de atrasados. “Mas até hoje não veio não. Nenhum tostão”, diz a aposentado Iracema de Aguair.

Um dinheiro que daria para consertar a casa e comprar os remédios da aposentada. “Está por qualquer hora essa casa cair em cima, a gente lutou muito”, conta Iracema de Aguiar.

Iracema, Domingos e outros moradores da região foram apresentados aos advogados pelo presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais e também vereador Geraldo Kenedy, o Tindico, do PSD. Ele recebeu o Fantástico em casa.

Tindico é acusado de usar um carro de som para atrair clientes e usar o prédio da Câmara de Vereadores para fazer reuniões entre os lavradores e os advogados. “Eu tento de todo jeito auxiliar as pessoas na aposentadoria. Inclusive eu forneço transporte de graça para as pessoas”, diz o vereador e presidente do Sindicato dos Trabalhadores,
Geraldo Kenedy "Tindico".

Ele admite que os advogados cobravam todo o valor dos atrasados dos aposentados.

“Era cobrado o valor total do retroativo. Alguns casos. Estranho a gente acha, mas se foi combinado, a pessoa aceitou no início, depois eu não tenho. Como que eu vou fazer?”, diz Geraldo Kenedy

O vereador foi acusado pelo Ministério Público Federal pelo crime de extorsão. O Fantástico procurou os advogados que cuidaram dos casos de Dona Iracema e Seu Domingos. Mas só Leonardo de Almeida Magalhães, aceitou falar por telefone.

Leonardo de Almeida Magalhães: No caso dos meus clientes, de maneira nenhuma eu recebo mais que eles
Fantástico: Então foram os lavradores que propuseram para o senhor que o senhor ficasse com todos o valor dos atrasados?
Leonardo de Almeida Magalhães: Uns que eu recebi, que eu fiquei com os atrasados, a proposta foi exatamente do cliente. A questão de alegar que são analfabetos ou semi-analfabetos isso aí, infelizmente eu considero uma desculpa. Porque eu não tenho que dar satisfação para o Ministério Público Federal ou Estadual. A tabela da OAB, ela especifica o mínimo que deve ser cobrado, não estipula o máximo.

“Existe regra que impede que o advogado receba um valor maior do que o cliente ao final do processo”, afirma o corregedor nacional da OAB Claudio Stabile.

Os advogados ficaram com 100% dos atrasados das duas vítimas. Não muito longe dali, na cidade de Manhuaçu, também em Minas Gerais, o Fantástico encontrou mais casos de cobrança abusiva em processos de aposentadoria.

Geraldo e Rita moram em uma casa simples. Ele é lavrador, ela, dona de casa.

“Eu sofri um acidente. Caí da escada apanhando café e tive fratura no joelho”, diz o aposentado Geraldo Balbino.

Sem poder trabalhar, Geraldo também procurou um advogado depois de ter a aposentadoria negada pelo INSS. Enquanto esperava a decisão do juiz, ficou sem a única fonte de renda que tinha.

Geraldo Balbino: Ficou difícil. Faltava as coisas dentro de casa. Problema de remédio. Faltava para mim. Eu não tinha nem como comprar remédio para mim.

“Nós acordamos, o café da manhã é taioba, o almoço é taioba, é mingau de taioba. No café da tarde vem a taioba de novo e à noite também. Os meus dois meninos mais velhos não sabiam o que era biscoito, porque comia pão velho, Fome. Fome”, relembra a dona de casa Rita Balbino.

Quando finalmente teve a aposentadoria concedida, ele nem fazia ideia de que tinha atrasados para receber.

“Um oficial de Justiça me procurou dizendo que era para eu procurar a Caixa Econômica Federal para receber essa quantia R$ 17,3 mil”, conta Geraldo Balbino.

Mas quando chegou ao banco...

“Segundo o gerente da Caixa, o dinheiro não chegou nem ir na Caixa. Direto do INSS já saiu para a conta do advogado. Eu liguei para ele, ele não atendeu. Eu fui no escritório dele, ele não apareceu para mim. Foi daí que eu já saí de lá com a certeza de que teria sido enganado. Infelizmente fui enganado por eles”, afirma Geraldo Balbino.

O advogado Altair Vinicius Pimentel Campos responde ao processo do Ministério Público Federal no caso do Seu Geraldo. Antes de dar entrevista para o Fantástico, ele se benzeu.

“Essa ação civil pública do Ministério Público é um absurdo. O Ministério Público só tem um foco nessa questão: é a autopromoção de um promotor incompetente, que propôs uma ação pública absurda. Nós cobramos um honorário de 30% sobre os atrasados que por ventura vierem a resultar da ação”, diz o advogado.

30%, afirma o advogado. Mas não foi essa a quantia que ele cobrou de Seu Geraldo, nem de Dona Catarina, quando ela entrou com pedido de aposentadoria depois de quase perder o pé.

“Eu perguntava ele sobre dinheiro e ele falava comigo que ainda não tinha chegado. Faz muita falta, porque eu dependo desse dinheiro porque dos remédios que eu tomo. Fiquei quatro anos procurando ele querendo saber dessa resposta”, disse aposentada Catarina Marques da Silva.

“Há o dever do advogado de prestar contas ao seu cliente. Ainda que simples, mostrar para o seu cliente 'olha recebi tanto, fiquei com tanto, estou te pagando tanto”, destaca o procurador da República Lucas Gualtieri.

Não foi isso que aconteceu. Dona Catarina só descobriu que tinha direito a R$ 28 mil de atrasados quando um oficial da Justiça chegou em sua casa com o aviso judicial. Mas o dinheiro também já tinha sido retirado do banco pelo advogado Altair.

“Só que ele não queria me dar os R$ 28 mil, não. Queria me dar 14 mil. Eu chorando demais com ele, ele me deu R$ 1 mil a mais”, conta Catarina.

Este é mais um entre centenas de casos que se espalham pelo Brasil inteiro e que estão sendo investigados pelo Ministério Público. “Os advogados também tinham ciência de que eram pessoas carentes que precisavam daquele recurso. E mesmo assim os advogados, em alguns casos, se apropriaram desses recursos”, diz a procuradora da República Ludmila Oliveira.

A Ordem dos Advogados do Brasil contesta a ação do Ministério Público Federal.

“Não cabe ao Ministério Público Federal punir ou julgar infração ética de advogado. Nos termos da lei, cabe ao tribunal de ética e disciplina da OAB julgar a infração ética”, diz o corregedor nacional da OAB Claudio Stabile.

“O Ministério Público está pedindo que seja limitada a cobrança de honorários nessas causas previdenciárias de baixa complexidade, até 20%. E os valores que foram cobrados além desse limite que sejam ressarcidos para os clientes”, defende a procuradora da República Ludmila Oliveira.

A fixação do limite dos honorários será decidida na Justiça Federal. Além da ação civil pública, os advogados podem responder a processos criminais.

“São investigados os crimes de apropriação indébita, que é o crime exatamente de uma pessoa que se apropria de um valor que não é seu. Há também o crime de sonegação fiscal. Há ainda o crime de patrocínio infiel, que é a situação na qual o advogado trai confiança do seu cliente”, diz o procurador Lucas Gualtieri.

Impossível saber quantos trabalhadores já foram enganados. As investigações dos procuradores constataram que, na maioria dos casos identificados, não houve contrato formal entre cliente e advogado.

Na cidade de Guanambi, no sudoeste do estado, a Justiça já está começando a ser feita.

Os advogados denunciados pelo Ministério Público foram condenados pela Justiça Federal de Guanambi a devolver em dobro todo o dinheiro que receberam a mais. E ainda ao pagamento de uma multa que equivale à metade dos valores que ultrapassaram o teto máximo de 20% de honorários.

Os advogados da Bahia recorreram da condenação da Justiça Federal de Guanambi. Agora a decisão cabe ao Tribunal Regional Federal, em Brasília.

“É bom deixar claro também que quem pratica ilícito são a minoria. A minoria da advocacia. Hoje no país nós temos quase 1 milhão de advogados, e a grande maioria é formada por advogados honestos”, destaca Alex Barbosa de Matos, presidente da OAB-Manhuaçu (MG)

Enquanto isso não se resolve, gente como Seu Geraldo e Dona Rita, Dona Iracema e Dona Catarina vão continuar sem ver os atrasados das aposentadorias. É tudo o que Dona Ercília deseja: ter de volta o dinheiro que o advogado cobrou a mais.

"Se chegar R$ 2,3,4 ou 5 mil, eu fico feliz demais, muito feliz. Fico alegre, alegre. Eu até saro. Porque eu estou deprimida de sofrimento”, diz a aposentada Ercília.

“Dá muita tristeza. Dá tristeza da gente pensar como é que pode uma pessoa ser ganancioso, que isso é ganância, porque ele tem. Ele tem profissão. E outra: tirar de quem não tem nada para oferecer”, diz Rita.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

GOLPE DO FALSO ALUGUEL



ZERO HORA 15 de janeiro de 2015 | N° 18043


CRISTIANE BAZILIO


Sonho de férias acaba na delegacia. GOLPE DO FALSO ALUGUEL é aplicado por dupla e faz dezenas de vítimas nos litorais de RS e SC



Desde outubro do ano passado, dois homens, que, segundo a polícia, são de Gravataí e Porto Alegre, aplicaram o golpe do falso aluguel pela internet e fizeram dezenas de vítimas no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. Eles anunciam, em sites gratuitos, imóveis para locação que não existem ou não estão disponíveis para alugar. Negociam com as vítimas por telefone ou e-mail e exigem depósito antecipado como garantia.

Em Capão da Canoa, no Litoral Norte, Carlos Alberto da Silva, zelador de um prédio, relatou que, na véspera do Ano-Novo, diversas famílias se encontraram no saguão procurando o mesmo apartamento. Ele garante já terem passado por lá pelo menos 50 pessoas:

– Chegam de mala e cuia, com o carro cheio de bagagens, crianças, bichinhos de estimação, e pedem a chave do apartamento. Digo que não está para alugar, e a reação é sempre igual: desespero e raiva.

Segundo a titular da delegacia de Capão da Canoa, Valquíria Meder, as ocorrências são remetidas para a cidade de origem das vítimas, onde deverão ser investigadas. Ela não soube informar a quantidade. Em Santa Catarina, a titular da delegacia de Bombinhas, Luana Chaves Servi Backes, apura os 12 casos até agora registrados na sua delegacia.

A pulverização das ocorrências por delegacias em diversas cidades torna difícil quantificar e mensurar oficialmente a ação dos estelionatários. O Diário Gaúcho apurou a existência de, pelo menos, 20 casos registrados na Polícia Civil relacionados à mesma dupla de golpistas. Titular da 17ª Delegacia de Polícia de Porto Alegre, o delegado Hilton Müller avalia que “o ideal seria que a polícia concentrasse as investigações em uma delegacia especializada para melhor atender as vítimas”.




“Tu te sentes arrasada”


Depois de fazer uma pesquisa na internet, uma moradora de Viamão, que pediu para não ser identificada, encontrou o apartamento ideal em Capão da Canoa. Três quartos, piscina e toda a infraestrutura que ela e o marido sonharam para passar o Réveillon com o filho.

Assinou contrato e fechou negócio em outubro do ano passado. Tudo por telefone e por e-mail. Mas, desde que fez o depósito bancário, não conseguiu mais contatar o suposto proprietário do imóvel.

– Procurei o anúncio no site e não estava mais. Liguei mil vezes, e ele não atendeu. Fui no endereço que constava no contrato, e não existia. Percebi a falcatrua e fui até Capão. Lá, o zelador me disse que era um golpe – lembra a mulher.

Além dos R$ 750 que havia depositado para os criminosos, ela e o marido desembolsaram mais dinheiro para alugar outro imóvel, em outra praia.

– É uma sensação de impotência, tu te sentes arrasada. Planeja um Ano-Novo com a tua família e de repente tudo se perde, a emoção acaba, e tu não sabes o que fazer – afirma.

Para a família de uma diarista de Porto Alegre, o prejuízo foi ainda maior. Eles passariam uns dias em Bombinhas (SC) no final do ano, mas acabaram sendo lesados em R$ 1,4 mil.

– Não chegamos a ir até lá, porque meu filho e minha nora perceberam a armadilha antes de viajarmos – lembra a diarista.

O filho explica que, quando percebeu os sinais do golpe, já era tarde demais.

– A conta que ele passou para depósito era de um terceiro. Quando questionei, ele disse que o apartamento era dele e do cunhado. Depois, vimos que havia divergência na data escrita no contrato e na data que aparecia no selo da autenticação. Não tenho expectativa de reaver o dinheiro, mas sim, que esses caras sejam presos e que novos golpes sejam evitados – diz o rapaz.



Entenda o golpe como prevenir


-Nas páginas de imobiliárias locais, os golpistas pegam fotos de imóveis de alto padrão e anunciam em sites de ofertas gratuitos, com valor bem abaixo do mercado, em endereços inexistentes ou que não correspondem ao imóvel.

-As negociações são feitas sempre por telefone ou e-mail.

-Eles elaboram contrato e enviam por e-mail para as vítimas, que devem devolver preenchido com todos os seus dados.

-Para fechar o negócio, exigem depósito antecipado na metade do valor acordado. As vítimas são instruídas a retirar a chave do imóvel com o zelador do prédio ou em uma imobiliária. Feito o depósito, os criminosos desaparecem.

-Só negocie com imobiliárias reconhecidas. Se tratar diretamente com o proprietário, que seja indicado por alguém que você conheça e que já tenha alugado com essa pessoa.

-Evite alugar imóveis em sites gratuitos de ofertas. Nesses espaços, não é exigido cadastro minucioso que permita identificar e localizar o anunciante se necessário.

-Exija a matrícula de propriedade do imóvel atualizada.

-Peça a documentação pessoal de quem está alugando e compare com a da matrícula.

-Desconfie de imóveis de alto padrão que estejam com preços surpreendentemente acessíveis, em especial na alta temporada.